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Reprodução pequena e árvore preferida: as peculiaridades da ararinha-azul

Espécie era encontrada em apenas uma região do Brasil e pouco se sabe de sua biologia reprodutiva

A beleza e raridade da Cyanopsitta spixii, ou ararinha-azul, não são à toa. O psitacídeo de tamanho médio e penugem azulada, cinza e esverdeada é o único representante de seu gênero e só era encontrado em uma única região do planeta: a Caatinga do Nordeste do Brasil, mais precisamente no município baiano de Curaçá, no Sertão do São Francisco. A ave foi descoberta em 1819, mas quando as atenções foram voltadas novamente para a ave, a população já era tão pequena que os estudos sobre a reprodução sequer foram realizados. Como a espécie está atualmente extinta da natureza, apenas quando for reintegrada por meio de um Plano de Ação do Governo Federal junto a organizações internacionais respostas para tais questões surgirão com mais acuidade.

“Toda a história da Ararinha começa por volta de 1990 quando se descobre os últimos animais na natureza, uma década antes da extinção”, conta Ugo Vercilio, analista ambiental da Coordenação de Ações Integradas para Conservação de Espécies do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente. “Inspirado na história do mico-leão dourado, várias organizações se organizaram para tocar o plano de reintrodução da ararinha-azul na natureza.”

O habitat histórico da ararinha-azul foi localizado na Caatinga da fronteira entre Bahia e Pernambuco, em um ponto quente e árido. Os principais meses da estação chuvosa são dezembro a abril, os quais apresentam as maiores precipitações. O pico da estação seca se dá normalmente em setembro a novembro. A localização foi estabelecida como o lar das ararinhas-azuis após observação dos últimos três indivíduos selvagens que habitavam a área dos riachos Barra Grande/Melancia. Outras localizações, como Riacho da Vargem, Riacho Macureré, margem do Rio São Francisco na seca e Riacho da Brígida apresentaram vestígios de ocupação por parte da espécie e também são reconhecidas como área de habitat.

Até onde se sabe, a alimentação das ararinhas-azuis obedecia à imprevisibilidade da Caatinga, uma vez que as variações climáticas afetavam a quantidade de água e comida. Tanto que as aves faziam pequenos deslocamentos sazonais. O habitat delas era restritivo justamente por conta disso, já que no período de secas o Rio São Francisco era a única fonte de água. De acordo com as observações dos últimos espécimes na natureza, as aves se alimentaram de pinhão (Jatropha mollissima), favela (Cnidoscolus phyllacanthus), juazeiro (Ziziphus joazeiro), baraúna (Schinopsis brasiliensis), imburana (Commiphora leptophloeos) e facheiro (Pilosocereus piauhiensis), além de enxerto (Phoradendron sp.), caraibeira (Tabebuia aurea), angico (Anadenanthera macrocarpa), umbu (Spondias tuberosa), unha-de-gato (Acacia paniculata), pau-de-colher (Maytenus rigida) e marizeiro (Geoffroea spinosa Pontual).

A biologia reprodutiva das ararinhas-azuis nunca pode ser adequadamente estudada. Não na natureza. Os únicos relatos foram fornecidos por moradores locais e até mesmo traficantes de aves. A observação do último macho selvagem, que formou par heteroespecífico com uma fêmea de maracanã ajudou a responder algumas questões.

“A espécie tem uma característica que é dela, a de não ser abundante. Nos relatos buscados junto à comunidade, registrou-se que nunca houve grupos muito grandes”, explica Ugo. “Além disso, a área de distribuição também não era grande. A espécie sempre foi restrita à região com árvores caraibeiras da mata ciliar, onde faziam os ninhos, mas a reprodução na natureza não foi observada por especialistas.”

A estação reprodutiva das ararinhas-azuis, que coincide com a de maracanãs, na área dos Riachos Barra Grande/Melancia dependia do início da estação chuvosa. Normalmente ocorria entre novembro e março. Os ninhos eram feitos em cavidades existentes em árvores e a postura continha de dois a três ovos. Acredita-se que dois ou três deles nasciam, mas apenas um ou dois chegavam à vida adulta. Estudos mostram que a espécie alcança idade reprodutiva entre quatro e cinco anos de idade, sendo que a fêmea com idade mais avançada a reproduzir tinha 24 anos. O período de incubação foi observado apenas em cativeiro e gira em torno de 27 dias. Cavidades deixadas para trás no habitat da ararinha-azul evidenciam que as árvores preferidas pela espécie para a nidificação eram a caraibeira e a muquém. Moradores locais afirmam que a mulungu também recebiam ninhos.

Quando à longevidade das ararinhas-azuis, todas as informações sabidas advêm de cativeiros. As aves mais velhas conhecidas são um macho que viveu por 30 anos em um zoológico de Nápoles (Itália) e uma fêmea em São Paulo que chegou aos 32 anos. Um outro macho que foi encontrado no Colorado (EUA), em 2002, e hoje está na Fundação Lymington, em São Paulo, teria aproximadamente 34 anos. Na natureza, o que voltará a ocorrer em breve, estima-se que a ararinha viva em torno de 40 anos.

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