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Governo tem plano para defender Cerrado

Para reduzir em 40% o desmatamento, PPCerrado prevê 151 ações de combate e controle do desmatamento, incentivo às práticas sustentáveis, ordenamento territorial e criação de 2,5 milhões de hectares em áreas protegidas no bioma
Publicado: Terça, 14 Setembro 2010 21:00 Última modificação: Terça, 14 Setembro 2010 21:00

Carlos Américo e Cristina Ávila *

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou, nesta quarta-feira (15), decreto que institui o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Cerrado (PPCerrado). O documento prevê 151 ações para reduzir a perda da cobertura vegetal e criar alternativas de proteção e uso sustentável dos recursos naturais do bioma.

Durante solenidade em Brasília, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, lembrou que o Cerrado ocupa 24% do território nacional e é responsável por 5% da biodiversidade do planeta, além de ser o berço das águas das principais bacias hidrográficas brasileiras.

Ainda segundo ela, o PPCerrado vai ajudar o Brasil a atingir a meta de reduzir em 40% o desmatamento no Cerrado, até 2020. "O plano é um passo para a implementação da Política Nacional sobre Mudança do Clima, além de coordenar ações da agricultura sustentável e siderurgia verde, em dois acordos setoriais".

Entre as metas do plano está o aumento do consumo de carvão de florestas plantadas pela indústria de ferro gusa e o aumento de recursos para recuperação de áreas degradadas. Até 2011, o Governo planeja investir R$ 339 milhões. O dinheiro será usado em ações de fomento às atividades produtivas sustentáveis, monitoramento e controle, ordenamento territorial, educação ambiental e criação de 2,5 milhões de hectares em áreas protegidas.

O monitoramento do Cerrado, realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), será permanente. Também será desenvolvido um sistema de detecção em tempo real, como o que funciona para a Amazônia Legal, que gerará informações capazes de agilizar as ações de comando e controle e reduzir o desmatamento no Cerrado.

Para o combate às queimadas, serão contratados 4,5 mil brigadistas. Além disso, agricultores familiares e assentados vão receber assistência técnica, capacitação e formação para acabar com o uso de queimadas para a produção.

A exemplo do que foi feito na Amazônia, o PPCerrado tem ações prioritários nos 20 municípios que mais desmataram no período de 2002 a 2008. Junto com as ações de repressão, o plano vai levar alternativas sustentáveis para o desenvolvimento dos municípios. De acordo com a ministra Izabella, serão incluídos sete novos produtos do Cerrado na lista do Programa de Garantia de Preço Mínimo para produtos da sociobiodiversidade.

"Vamos conversar com os prefeitos e desenvolver medidas para prevenir e tentar tirar esses municípios da lista dos que mais desmatam o cerrado. Vamos dirigir políticas como os programas Arco Verde e Mais Ambiente, e tirar as pessoas da irregularidade ambiental dando alternativas econômicas mais sustentáveis", destacou.

O plano prevê para 2020 o aumento do número de unidades de conservação e a implementação do Macrozoneamento Ecológico Econômico do Cerrado. "O Brasil é responsável por 70% das unidades de conservação criadas na última década. Vamos chegar na Conferência da Biodiversidade em Nagoya (Japão) com a alma lavada e com o dever cumprido. Vamos trabalhar para o protagonismo da conservação da biodiversidade e para a convergência com a questão climática", finalizou a ministra. A Conferência de de Biodiversidade acontece de 18 a 29 de outubro, em Nagoya, no Japão.

O que é o PPCerrado

A primeira versão do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Cerrado (PPCerrado) foi lançada em setembro de 2009, para consulta pública, com iniciativas integradas do MMA e instituições vinculadas - ICMBio, Ibama, Serviço Florestal Brasileiro e Agência Nacional de Águas - com a participação de órgãos ambientais dos estados abrangidos pelo bioma.

A proposta de redução em 40% foi devida à taxa anual média de desmatamento do bioma observada entre 2002 e 2008 - o ano que antecedeu a COP. Segundo o Centro de Sensoriamento Remoto do Ibama, que executa o Projeto de Monitoramento dos Biomas Brasileiros (MMA/Ibama/Pnud), o total acumulado de perdas da vegetação nativa até 2002 era de 890.636 km² e, em seis anos, foi acrescido de 85.074 km², o que equivale a valor médio anual de 14.200 km². Considerando a área original de 204 milhões de hectares, o Bioma já perdeu até 2008 47,84% de sua cobertura de vegetação nativa.

O PPCerrado é um dos instrumentos operacionais do Programa Cerrado Sustentável e está em consonância com planos e políticas já existentes, como, por exemplo, a Política Nacional de Biodiversidade, que estabelece diretrizes de ampliação do número de áreas protegidas, e a Política Nacional de Recursos Hídricos, que prevê planos estratégicos para o uso das águas. Porém, a COP e a instituição da Política Nacional sobre Mudança do Clima favoreceram o envolvimento do conjunto do Governo Federal nas ações de prevenção e controle do desmatamento, principalmente no Cerrado.

Considerado a savana mais rica do mundo, o Cerrado representa 5% da biodiversidade do planeta, e é um dos biomas mais ameaçados do País. O desmatamento ocorre intensamente em função de suas características propícias à agricultura e pecuária, além da demanda por carvão vegetal para a indústria siderúrgica, especialmente em Minas Gerais e mais recentemente em Mato Grosso do Sul.

Brasilidade do Cerrado

O bioma é diverso não apenas em relação à fauna e flora, mas também é rico em patrimônio cultural. Nele despontam importantes cidades brasileiras e em áreas rurais vivem quilombolas, índios, sertanejos, com uma infinidade de gêneros humanos que o torna ainda mais interessante. Para resguardar essa qualidade, o MMA se integra a outros órgãos e ministérios do Governo Federal para o fomento a ações de desenvolvimento sustentável. Um dos projetos de destaque nesse sentido é a parceria com a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), que resultou na definição de preços mínimos para a valorização de produtos extrativos sem que a coleta cause danos ambientais e comprometa a reprodução vegetal.

No quilombo de Boitaraca, município baiano de Nilo Peçanha, a iniciativa significa independência e melhoria da renda familiar. Lá, o preço da piaçava que desde 1990 estava estacionado em R$ 14 a arrouba pulou para R$ 25. A comunidade tem garantia de venda e ainda conseguiu se livrar dos atravessadores. O preço mínimo da piaçava foi determinado pela portaria 522, do Ministério da Agricultura, em 21 de julho de 2010, junto com outros produtos do extrativismo, como açaí, babaçu, borracha, castanha do Brasil, pequi e umbu.

Há mais de 100 anos, as 120 famílias da comunidade Boitaraca vivem do extrativismo da piaçava, um aprendizado que passou por várias gerações. A atividade representa 90% de sua economia, e até as mudanças provocadas por ações do MMA e Conab o trabalho ainda era semi-escravo, pois os quilombolas se submetiam a preços ínfimos estipulados por intermediários que ganhavam a maior parte da renda da comercialização. As ações de governo os fizeram também pensar em ampliar negócios. Eles já começaram a fabricar vassouras para ganharem mais do que na venda da simples matéria-prima.

O MMA também tem projetos voltados ao desenvolvimento de Arranjos Produtivos Locais (APL) que envolve cerca de 10 mil quebradeiras de coco de babaçu, quilombolas, geraizeiros (das Gerais) e sertanejos. Ao norte de Minas, por exemplo, é incentivada a produção de frutos nativos, em regiões em que o Cerrado está em grande parte ocupado com o plantio de soja. Outras ações voltadas para a valorização dos produtos da biodiversidade vão desde projetos com bordadeiras que utilizam sementes, em São Felix do Araguaia (TO), à extração do jenipapo para a produção de licor, em São Luiz Gonzaga do Maranhão, e à produção de azeite de coco de babaçu, no Lago do Junco, também no Maranhão.

Comunidades indígenas

Um dos poucos povos indígenas que habitam o estado de Minas Gerais, os Xakriabá têm uma história de conflitos que começou com ataques de bandeirantes e depois de fazendeiros que invadiram suas terras. Mas o Cerrado ainda produz seus frutos na terra desses índios que lutam pela ampliação de território. Hoje, eles vivem um momento de valorização cultural e de proteção de seu patrimônio. E são um dos casos de sucesso dos projetos da Carteira Indígena do MMA, que contribuiu com o resgate de cultivos tradicionais de mandioca e de espécies crioulas de milho e feijão. Eles já têm um banco de sementes e, nas aldeias Vargem e Tenda, 210 famílias aprenderam a garantir a diversificação de alimentos com proteção do solo, reduzindo danos ambientais e a compra de farinha industrializada. Assim, também são estimuladas as trocas de informações e comércio entre as aldeias, com o fortalecimento da organização comunitária, para a produção familiar e cooperativa do produto.

O MMA tem contribuído para isso, por meio de investimentos feitos pela Carteira Indígena, que funciona em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Sustentável, iniciada em 2004, no contexto do Programa Fome Zero, e de acordo com reivindicações dos próprios povos indígenas. Também conta com parcerias com a Embrapa, Funasa e outros órgãos governamentais. Em todo o Brasil, são 295 projetos, em beneficio de 21.778 famílias indígenas.

O Cerrado é habitado por dezenas de povos indígenas. Entre eles os Kuikuru, que entre novembro e dezembro fazem uma grande colheita com milhares de frutos para fazer a Festa do Pequi. Eles falam uma língua da família caribe herança da época que viviam nas fronteiras do Brasil com a Venezuela e a Guiana. São mais de setecentos índios, que vivem no Parque do Xingu, em Mato Grosso. Ao sul do território, existem grandes áreas de cerrado, onde cultivam espécies de pequizeiros que produzem frutos variados, com tonalidades que vão do amarelo ao laranja e em tamanhos bem maiores do que os conhecidos em outras regiões do bioma.

Geografia fantástica

O Cerrado é considerado a mais rica das savanas neotropicais e uma das mais ricas do mundo - grande heterogeneidade geográfica. O bioma tem geografia bastante atraente, com cenários diversificados, onde se situam regiões das três maiores bacias hidrográficas sul-americanas, a Bacia do Paraná, a Bacia do Araguaia - Tocantins, e a Bacia do São Francisco. A fauna apresenta espécies comuns à Amazônia, Caatinga e Floresta Atlântica.

Belezas que necessitam cuidados. Como exemplos dessa geografia fantástica, está a Chapada dos Guimarães (MT), o Jalapão (TO) e a Chapada dos Veadeiros (GO). Entre as belas paisagens brasileiras está Guimarães, em Mato Grosso, a 70 km da capital, 1500 km entre o Atlântico e o Pacífico. É uma chapada de cânions de arenito, com até 350 metros de altura, na borda do Planalto Central, com território protegido pelo Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, que faz parte das unidades de conservação sob responsabilidade do MMA e que tem cerca de 46 sítios arqueológicos catalogados, com pinturas rupestres. Possui altitudes entre 600 e 850 metros, em áreas de proteção de nascentes e cabeceiras de vários rios, como Coxipó e Mutuca, que alimentam o Cuiabá. A quantidade de águas que caem por declives formam cachoeiras espetaculares. Predominam as espécies comuns do bioma, como murici e o pequi. Entre os mamíferos que passeiam em seus recantos estão o lobo-guará, o veado-campeiro e o gato-palheiro. Aves como a águia-real e o raro socó-boi, de rapina, ameaçadas de extinção, voam na plenitude dos ares.

O Jalapão é outro dos lugares fantásticos do Cerrado. Passou a ser conhecido no País depois da descoberta da comunidade de Mumbuca, onde tradicionalmente as mulheres tecem os fios do capim dourado. O povoado tem cerca de 200 habitantes, em meio a cerca de 3 milhões de hectares de cerrado em bom estado de conservaçãom, no estado de Tocantins, divisa do Piauí, Maranhão e Bahia. Para proteção ao meio ambiente e favorecer pesquisas científicas, foi criado em 2001 a Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins, em municípios que abrangem Tocantins e Bahia, com cerca de 700.000 hectares. A área abriga nascentes que correm cristalinas e esverdeadas, especialmente dos afluentes do Tocantins e São Francisco.

Na Chapada dos Veadeiros, local entre os mais apreciados pelos brasilienses, 220 km da capital brasileira, situa-se sobre imensa placa de cristal, que deixa ver fragmentos na superfície, encantando turistas. Com lindo horizonte desenhado por montanhas, veredas, campos e florestas de cerrado, resguarda o divisor das águas dos rios Maranhão e Paraná, com altitudes que variam de 600m a 1.650m. O Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros foi criado em 1961 e protege 65.514 hectares cachoeiras de beleza ímpar.

Perfil do Cerrado

Área: 2.036.448 km² - 204 milhões de hectares. É o segundo maior bioma da América do Sul.

Proporção relacionada ao Brasil: 22% do território nacional.

Abrangência (IBGE): Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia, Maranhão, Piauí, Paraná, São Paulo e Distrito Federal. Em 1.387 municípios brasileiros.

População: Cerca de 25 milhões de habitantes, 15% da população nacional, sendo que 83% vivem em áreas urbanas (IBGE, 2000).

Importância hidrográfica: Abriga as nascentes das três maiores bacias hidrográficas da América do Sul (Amazônica/Tocantins, São Francisco e Prata), o que resulta em um elevado potencial aquífero e favorece a sua biodiversidade.

Flora: 11.627 espécies de plantas nativas.


Fauna: 320.000 espécies.

Insetos: 99.000 espécies.

Mamíferos: 199 espécies.

Avifauna: 837 espécies.

Peixes: 1200 espécies.

Répteis: 180 espécies.

Anfíbios: 150 espécies.

Espécies de uso medicinal: cerca de 220.

Espécies da fauna ameaçadas de extinção: cerca de 140.

Áreas protegidas: Apesar do reconhecimento de sua importância biológica, de todos os hotspots mundiais, o Cerrado é o que possui a menor porcentagem de áreas sobre proteção integral.

Apresentação do PPCerrado

*Edição: Paulenir Constâncio

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