Intervenção da Senadora Marina Silva, Ministra do Meio Ambiente do Brasil
Painel Ministerial 2
Senhor Presidente,
Desejo, inicialmente, felicitá-lo por sua designação para presidir os trabalhos deste painel e reiterar o compromisso do Brasil com o fortalecimento das instâncias multilaterais para enfrentar o desafio da mudança do clima. Felicito, também, o comprometimento e a qualidade do trabalho realizado por nossos irmãos argentinos na organização desta Conferência.
A questão da mudança do clima é de grande importância para o Brasil. Preocupam-nos os impactos sobre a biodiversidade, ecossistemas, regioes costeiras e sobre setores estratégicos para o país como a agricultura. Também nos causam apreensão episódios em países em desenvolvimento, como furacões, enchentes, secas com graves repercussões sociais, econômicas e ambientais, algumas das quais irreversíveis, especialmente nas nações mais pobres.
É forçoso reconhecer que pouco se avançou em termos de ações concretas na área de adaptação à mudança do clima, a despeito do consenso hoje existente sobre a importância do tema, e dos impactos dos eventos climáticos extremos que já começam a se fazer sentir.
A questão da adaptação é hoje reconhecida como parte da agenda positiva do regime de mudança do clima. Apesar de as populações dos países em desenvolvimento serem as mais vulneráveis ao fenômeno, a adaptação envolve um comprometimento ético tanto da parte dos países que têm metas de redução de emissões quanto dos países em desenvolvimento.
Senhor Presidente,
O momento atual requer a superação de antigos impasses e a construção de políticas equilibradas que enfoquem a questão da adaptação do prisma dos impactos mais imediatos e daqueles de mais longo prazo.
Uma estratégia para ações futuras na área de adaptação deve ser pensada em dois momentos: compreensão do fenômeno da mudança do clima e seus impactos, e definição de linhas de ação efetivas para enfrentar o problema.
A questão da previsão dos impactos futuros da mudança do clima constitui um dos principais desafios científicos da atualidade. Ainda que haja limitações quanto ao conhecimento da evolução do clima em âmbito planetário, o grau de incerteza é mais elevado nas regiões mais pobres do planeta, em função da ausência de estudos aprofundados sobre a evolução do clima nessas regiões.
A superação desse problema envolve outro dos grandes desafios para a evolução futura do regime: o desenvolvimento de uma política de cooperação científica e tecnológica de grande alcance ao amparo da Convenção.
Diversos países em desenvolvimento têm promovido esforços na área de adaptaçao, mas sao esforços pequenos diante da dimensão do problema. Por isso é preciso que sejam identificados mecanismos de apoio, especialmente financeiros, para aprofundar parcerias, com vistas à formação de uma rede de centros de pesquisa em ciências climáticas em países em desenvolvimento, proporcionando o suporte necessário às ações de adaptação.
Senhor Presidente,
A questão de vulnerabilidade e adaptação deve ser tratada de maneira objetiva, inclusive com o desenvolvimento de modelos que levem em conta as necessidades dos países em desenvolvimento. Nesse esforço, a participação de técnicos e cientistas, bem como o fortalecimento das instituições dos países em desenvolvimento são cruciais.
O esforço de modelagem de cenários de vulnerabilidade é combinado com outras medidas no sentido da conservação do meio ambiente. Destaco, neste particular, o esforço para reduzir drasticamente o desmatamento, especialmente na Amazonia.
Esse esforço está ancorado num sistema de gestão, coordenado no mais alto nível do Governo Brasileiro, capaz de maximizar os benefícios da exploração sustentável dessas áreas e promover a correta distribuição dos benefícios econômicos, com transparência e controle social.
Contudo, Senhor Presidente, os esforços dos países em desenvolvimento para a proteção de seus ecossistemas podem ser anulados pela ausência de comprometimento com as decisões que tomamos no passado no âmbito desta Convenção.
Praticamente nada se fez, até agora, não só para avaliar e entender os impactos da mudança climática sobre ecossistemas vulneráveis como as florestas tropicais, como, também, para a adoção de medidas concretas que apóiem os países em desenvolvimento na adaptação a esses impactos. A conseqüência da inação, nesse caso, é a perda substantiva da diversidade biológica que os mesmos países que aqui estão tanto combatem em outros foros internacionais.
A questão da adaptação às mudanças climáticas deve ser vista além da abordagem das emergências ambientais. Algumas das mudanças climáticas previstas levarão décadas para se completar e por isso não podem ser reduzidas às emergências.
Senhor Presidente,
Não há tempo a perder. Na verdade, muito tempo já se passou sem que esforços significativos tenham sido feitos nessas questões que aqui estamos discutindo. Parece evidente que os mais afetados pela mudança climática - os países em desenvolvimento - não estão tendo suas necessidades reconhecidas por aqueles que não só são os principais responsáveis por esses impactos mas também são aqueles que mais capacidade têm de mitigá-los, estudá-los e promover as medidas de adaptação necessárias. Tampouco parece estar havendo o reconhecimento do principio consagrado nesta Convenção de que as responsabilidades são comuns, mas diferenciadas.
Preocupa-me a forma como alguns países têm conseguido retardar ou dificultar negociações com base em seus interesses imediatos, de ordem puramente econômica. A entrada em vigor do Protocolo de Quioto é alvissareira, mas não podemos deixar de reconhecer o tempo que se passou até que esse instrumento se tornasse realidade e as conseqüências decorrentes desse atraso. Não podemos esperar o mesmo no que diz respeito às medidas de adaptação à mudança climática. É hora de provarmos, não a nós mesmos, mas às sociedades que aqui representamos, que estamos mais comprometidos do que demonstram os resultados de nossas ações até agora. Não temos o direito de falhar!
Muito obrigada.
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