Brasília (DF) - O físico Amory Lovins (foto), do Instituto Rocky Mountain, no Colorado, é um dos mais importantes cientistas independentes dos Estados Unidos, consultor de governos, empresas e organizações não-governamentais. Visionário, ele desenvolveu, há 12 anos, o hipercarro, um veículo seis vezes mais eficiente que os convencionais e que deve ser produzido em série nos próximos anos. Polêmico, publicou, em 1999, o livro Capitalismo Natural. Militante, foi um dos renomados pensadores que participaram da primeira edição dos Diálogos para um Brasil Sustentável, entre 12 e 15 de agosto, em Brasília. O evento, que trouxe subsídios para a 1ª Conferência Nacional do Meio Ambiente, marcada para o fim de novembro, foi uma realização do Ministério do Meio Ambiente em parceria com Fritjof Capra, Instituto Ecoar para a Cidadania e Projeto Brasil Sustentável e Democrático. Nesta entrevista, concedida à Assessoria de Imprensa do Ministério, Lovins explica o potencial do hipercarro e fala da resistência que o hidrogênio vem enfrentado nos Estados Unidos.
Diálogos - O hipercarro, criado em 1991 pelo Instituto Rocky Mountain, teve a sua patente aberta há 10 anos. Qual a diferença desta tecnologia em relação aos veículos convencionais?
Amory Lovins - O hipercarro é um veículo mais eficiente. Ele é muito leve, pois não é feito de metal, mas de compostos de fibra de carbono - um material semelhante, porém mais barato ao utilizado nos carros de Fórmula 1 - com baixa resistência do ar devido à aerodinâmica. Estas propriedades significam que ele precisa três vezes menos energia para andar. Com um motor à gasolina comum, melhora a eficiência em três vezes. Se o motor for híbrido-elétrico, a eficiência melhora quatro vezes. Se for híbrido com diesel, é cinco vezes mais eficiente. E com a célula de combustível com hidrogênio, o hipercarro melhora até seis vezes a eficiência em comparação com os automóveis tradicionais. O motor e o tanque também têm um tamanho três vezes menor.
Diálogos - E o desempenho?
Lovins - O veículo que desenvolvemos em 2000, na nossa pequena firma (Hypercar Inc; www.hypercar.com) é um automóvel para cinco pessoas, alcança 100 km/h em menos de 10 segundos, com uma autonomia de 530 quilômetros. Ele tem menos da metade do peso de um carro convencional, mas, apesar de ser mais leve, é também mais resistente. Ele pode bater em uma parede a 56 km/h e proteger os passageiros.
Diálogos - E quando este veículo mais eficiente será produzido em massa?
Lovins - Nós não somos uma montadora de veículos. Desenvolvemos tecnologia e design para as montadoras. Com investimentos agressivos, a produção em série pode começar até 2008. Hoje, o preço seria competitivo com um veículo esportivo de luxo. Mas ele pode competir com carros médios - como o Ford Explorer - se os projetistas alcançarem mais um estágio de refinamento, o que reduziria em um 25% os custos.
Diálogos - Durante os Diálogos para um Brasil Sustentável, houve muita resistência de técnicos e ecologistas brasileiros à idéia defendida pelo Instituto Rocky Mountain de fazer a transição da economia do petróleo para a economia do hidrogênio. Por quê?
Lovins - Esta resistência não é incomum. Muitas pessoas não compreendem o hidrogênio tão bem como eles imaginam. Eu acabo de publicar um texto sobre isso em nossa página (www.rmi.org), chamado Vinte mitos sobre o hidrogênio. Estes mal entendidos são muito comuns. Parte desta resistência é política. O mesmo acontece nos Estados Unidos.
Diálogos - O recente apoio do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, à transição para o hidrogênio influencia esta resistência?
Lovins - Muito. Eu tenho certeza que a resistência dos norte-americanos se deve ao apoio do presidente Bush e de muitas empresas de petróleo e também de energia nuclear. Então muitos ambientalistas acreditam que é algo ruim. E muitos ecologistas são contra o Wall Street Journal, pois o jornal também acha que é algo ruim. Muitos não entendem bem, então são contra ou favoráveis por falsas razões. Como os defensores da energia nuclear, que apóiam achando que vão salvar a sua tecnologia, mas na verdade o hidrogênio vai acabar ainda mais rápido com a tecnologia nuclear. Os políticos estão muito confusos. E estamos tentando mostrar o que é verdadeiro do ponto de vista tecnológico e econômico.
Diálogos - Como o hidrogênio poderia ser usado no Brasil?
Lovins - No curto prazo, pode ser usado para fornecer energia para prédios que precisam de fontes de energia confiáveis de alta qualidade, por exemplo, para manter em funcionamento computadores e equipamentos médicos em hospitais. As células de combustível já são competitivas hoje, como demonstrou o meu colega Joel Swisher, que também participou dos Diálogos, em um trabalho chamado Cleaner Energy, Greener Profits. Outro uso valioso é na substituição da gasolina nos automóveis. Convertendo, por exemplo, hidroeletricidade ou energia eólica em hidrogênio. Este futuro é surpreendentemente atrativo também para empresas de petróleo. Em geral, o hidrogênio nos hidrocarbonetos é mais valioso sem o carbono do que com o carbono. Mesmo que ninguém pague você para não colocar o carbono na atmosfera.
Diálogos - De todas as propostas trazidas aos Diálogos para um Brasil Sustentável pelo senhor e pelo Dr. Joel Swisher, quais deveriam ser mais consideradas pelos técnicos do governo, pesquisadores e ecologistas brasileiros?
Lovins - O princípio do menor custo para fazer investimentos em energia. E ter certeza de que as companhias de distribuição que estão vendendo eletricidade são premiadas não por vender mais uma commoditie, mas por reduzir a sua conta de luz. É possível fazer isso separando o lucro destas empresas do volume de energia vendido, não premiando por vender mais e não penalizando por vender menos. E depois permitindo um lucro extra pela energia economizada, ajudando a ser mais eficiente.
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