Para o mestre em educação Jean Pierre Leroy (foto), do Programa Brasil Sustentável e Democrático, a monocultura está ultrapassada. Ele defende a agricultura ecológica, o cultivo sem venenos e insumos químicos, como uma forma de revitalizar o território brasileiro, oferecendo não só alternativas de produção para pequenos agricultores como fonte de alimentos de melhor qualidade para a população. Leroy é também técnico da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) e consultor de movimentos sociais brasileiros. Jean Pierre concedeu entrevista à equipe dos Diálogos para um Brasil Sustentável, nesta quarta-feira.
Os Diálogos para um Brasil Sustentável são uma parceria entre o Ministério do Meio Ambiente, Fritjof Capra, Instituto Ecoar e Programa Brasil Democrático e Sustentável.
Diálogos ? Quais os benefícios da agroecologia e como implementa-la?
Jean Pierre ? Os benefícios, primeiramente, são para a agricultura familiar, porque as experiências de integração agroindustrial e de subordinação à agroindústria se mostraram prejudiciais à agricultura de pequeno porte. Muito poucos conseguem se sustentar com a produção nas bases da Revolução Verde. Em segundo lugar, trará benefícios ao conjunto da sociedade, porque se observarmos, por exemplo, o que acontece nas grandes cidades da Região Sudeste, o tema da degradação dos recursos naturais e principalmente da água se torna crucial. E isso não é por acaso. Deve-se a séculos de exploração descontrolada da natureza, que levaram a escassez em muitas bacias, à degradação da biodiversidade. Em contrapartida, a agroecologia, pelo uso mais racional dos recursos ecológicos, pela preservação dos recursos biológicos, é fundamental para nossa segurança e soberania alimentar. Para o futuro, precisamos de um estoque de sementes nativas, um verdadeiro histórico genético produzido pela agricultura familiar e ecológica. A agroecologia é importante ainda para o desenvolvimento local. Pesquisas mostram que assentamentos feitos em locais com uma economia deprimida levaram à renovação econômica de muitos municípios, encontrando uma dinâmica e uma vida que não tinham.
A palavra chave para implementação da agroecologia no país é transição. Não há condições para se passar de um modelo para outro de forma abrupta. O latifúndio ainda tem enorme poder, o que traria uma série de entraves a essa mudança. Temos que levar em conta, ainda, o fato de que a agroecologia ainda não tem condições de atender a atual demanda, precisamos de uma produção em maior escala. Devemos salientar também que não se trata de repetir o velho, mas sim projetar o futuro recuperando uma enorme riqueza do passado.
A população urbana precisa perceber o que está em jogo. Infelizmente ela não dispõe das informações suficientes para avaliar a gravidade da situação e a importância do que estamos dizendo aqui. Então, a transição será geral, política, educativa e econômica. A população tem que decidir sobre o futuro do país.
Diálogos ? Como isso se refletiria em políticas públicas?
Jean Pierre ? Primeiro, em conformidade com algumas diretrizes do governo Lula, como a da transversalidade, somando esforços institucionais e de vários ministérios. E essa união deveria se dar sobre políticas já definidas, como o Fome Zero. Esse programa define um número de municípios para ação emergencial e também mudanças nos sistemas de produção, de economia local. A Agenda 21 define como prioritários, por exemplo, áreas de periferia e o Arco do Desflorestamento, na Amazônia, áreas de fronteira. A luta contra o fogo (queimadas) destacou 60 cidades para uma ação prioritária, e esses locais também poderiam ser definidos para se iniciar essa transição. Além disso, muitos municípios, principalmente na Região Sul, já desenvolvem iniciativas agroecológicas. Esses deveriam ser alvo de ações integradas de municípios, Estados e União para ampliação em escala da produção.
Diálogos ? No Estado de Santa Catarina, por exemplo, onde existem experiências em agroecologia, predomina a produção industrial de suínos e aves voltadas à indústria, com grande impacto ambiental. Como começar a mudar esse quadro?
Jean Pierre ? Um dos problemas é que ainda não temos pesquisas sobre os reais impactos ambientais e na saúde da cultura intensiva. Assim, a população do oeste catarinense ainda não tem a dimensão dos prejuízos desse modelo. No entanto, as empresas que se instalaram há anos na região já estão se deslocando. A Sadia, uma das maiores produtoras, está se transferindo para o Mato Grosso, deixando um passivo ambiental para a região. Mas isso pode se tornar uma oportunidade para uma mudança no modelo econômico da região.
Diálogos ? A desembargadora Selene Maria de Almeida, do TRF da 1ª Região, decidiu ontem pela liberação dos organismos geneticamente modificados no Brasil. Qual a sua opinião?
Jean Pierre ? Eu "parabenizo" a juíza por ter conseguido resultados que ninguém conseguiu até hoje, já que o meio científico tem posições controversas sobre a segurança desses produtos. Ainda há um campo enorme para a pesquisa, para a investigação. Chega a ser paradoxal que ela tenha tomado uma decisão quanto a um tema sobre o qual tão poucas pessoas se arriscam a opinar em todo o mundo. Se a decisão não for reconsiderada, o nome dela será associado a uma grande catástrofe no país, que poderá acontecer. Vejo isso como a tática dos pequenos passos, pois, já que não conseguem aprovar a liberação em bloco, o fazem em pequenos passos consumados. Enquanto isso, muitas pessoas que pensam em um futuro diferente, melhor, são marginalizadas pela ideologia dominante.
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