JUVENAL VICENZI
A necessidade de integrar os setores governamentais e a sociedade civil à gestão dos recursos hídricos é um dos desafios apontados por debatedores no painel 20 anos da Lei das Águas: Avanços e Desafios realizado em Brasília, na manhã desta quarta-feira (21/3). As discussões integram a programação do seminário Águas do Brasil, promovido pelo Ministério do Meio Ambiente e pela Agência Nacional de Águas (ANA). A Lei das Águas foi elaborada em 1997 para se tornar um instrumento moderno e democrático da gestão dos recursos hídricos.
Para o secretário-executivo do Ministério, Marcelo Cruz, que presidiu o painel, os recentes episódios de escassez de água – verificados especialmente no Distrito Federal e em São Paulo – expõem a necessidade de uma ampla avaliação do gerenciamento hídrico. “Tais situações seriam inimagináveis até pouco tempo. Esses episódios nos fazem refletir sobre a implantação da Lei, que desde a sua criação trouxe avanços importantes. Um dos pontos unânimes que identificamos neste debate é a necessidade de uma gestão compartilhada entre os diferentes setores e a sociedade civil”, disse. Segundo ele, o tema água deve figurar na agenda prioritária dos governos.
COMITÊS DE BACIAS
Para o consultor e ex-ministro do Meio Ambiente, João Carlos Carvalho, a Lei, que completa duas décadas, representou um importante avanço. Entre os aspectos positivos, ele destacou as outorgas – instrumentos que têm o objetivo de assegurar o controle quantitativo e qualitativo do uso da água. Também defendeu a atuação dos Comitês de Bacias Hidrográficas (CBH) que, em sua visão, atuam como responsáveis pela governança e tem o papel de pactuar o uso da água, gerir conflitos e efetivar a implantação da lei.
Como desafio, João Carlos Carvalho mencionou que a Lei das águas foi elaborada em um período em que o Brasil ainda não vivenciava situações graves de escassez. “A legislação foi concebida numa situação de abundância de água. Precisamos aprimorar as novas políticas, que devem ser pensadas nas condições atuais de escassez, sobretudo, de água potável”, ressaltou.
João Carlos Carvalho apontou, ainda, o desafio de integração entre as políticas. “A gestão dos recursos naturais é tratada equivocadamente como se fossem recursos separados na natureza. Entretanto, o solo, a água e a vegetação são interdependentes na natureza. Desta forma, as políticas públicas também devem ser construídas de forma integrada”. Para ele, as ações governamentais devem priorizar as nascentes e as matas protetoras dos recursos hídricos. “Devemos acabar com a visão limitada que enxerga o ciclo da água apenas entre os reservatórios e as torneiras das casas”, disse.
AQUECIMENTO GLOBAL
Já o ex-deputado e ambientalista Fábio Feldman, um dos relatores da Lei da Águas, Lei nº 9433/1997, afirmou que “a lei é indispensável, mas é preciso avançar. Hoje, por exemplo, a dimensão do impacto da água sobre o aquecimento global está muito mais evidente do que há 20 anos, quando elaboramos a lei”.
Para ele, é necessária uma melhor definição do papel da União, estados, municípios e regiões metropolitanas, levando-se em conta as diferenças ambientais. “Temos situações que dificultam o gerenciamento como o fato, por exemplo, de água superficial ser da União e a subterrânea dos estados. Isso acaba gerando conflitos, é algo que deve ser rediscutido”.
O debate foi concluído com a fala do diretor-presidente da (ANA), Vicente Andreu. Para ele, também é necessário caminhar no sentido de uma política mais integrada com os diferentes setores. O diretor-presidente defendeu uma proteção mais ativa das nascentes e uma gestão mais participativa da sociedade civil. “Temos situações críticas de poluição dos mananciais, o que impossibilita o uso da água. As pessoas infelizmente não percebem a água, apenas o uso que é feito dela. Precisamos mudar essa visão. Deve-se ter uma mensagem clara à população de que a água não pode ser consumida de forma ilimitada”, afirmou. Andreu disse, ainda, que a ANA pretende lançar um programa de monitoriamento da qualidade da água pela sociedade civil.
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